sexta-feira, 11 de junho de 2010


"Em meados de junho
os jacarandás de Lisboa estão em flor,
a sua luz fende a pupila,
acaricia o dorso da sombra.
É então que – sei lá se pela última vez –
a inocência volta a entrar na minha vida.
Olhos, mãos, alma, tudo é novo –
recomeço a prodigalizar alegria,
uma alegria que não procura palavras
porque o seu reino não é o da expressão.
Digamos que esta nova experiência,
a que não quero dar nome,
não se preocupa em interrogar,
talvez por já não ser tempo de dúvidas,
ou então por não lhe dizerem respeito
essas verdades últimas, cegas como facas.
Não é um poema de obediência
o que me proponho nestas linhas;
trata-se de outra coisa:
levar à boca fresca do ar
o ardor das areias queimadas.
Mas sem palavras, sem palavras."
.
Eugénio de Andrade

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